Foi nos anos 90 que a internet entrou na casa de boa parte da geração que hoje está entre os 30 e os 40 anos. A conexão era lenta, barulhenta e limitada, mas já trazia consigo a promessa de um mundo novo. Trinta anos depois, essa mesma geração é a que mais sente o peso das mudanças que o digital provocou no trabalho, nos vínculos, na memória e na forma como se entende no mundo.
Somos a geração que cresceu com a internet. Passamos do ICQ ao WhatsApp, dos blogs ao TikTok, da promessa de liberdade à cultura do desempenho. E mesmo depois de tantos anos online, ainda estamos tentando entender o que isso tudo fez com a gente.
A vida mediada por telas
O online deixou de ser um espaço à parte da vida real. Hoje, tudo passa por ele. Do trabalho aos encontros, das compras ao lazer. Isso trouxe uma sensação de conexão permanente, mas também de exaustão contínua. A fronteira entre público e privado foi borrada, e a ideia de descanso virou um luxo. Estar sempre disponível virou uma expectativa silenciosa.
O problema é que ninguém nos ensinou como lidar com tanto acesso. Estamos em uma geração que vive no limiar entre o vício digital e a tentativa de reconexão com o mundo físico. Entre o prazer do compartilhamento e o cansaço da exposição constante.
Memória fragmentada, atenção rarefeita
Quantas vezes você abriu o celular para ver uma notificação e, dez minutos depois, esqueceu o que estava procurando? A forma como consumimos informação mudou completamente. Rolagens infinitas, excesso de estímulos, multitarefas. Tudo isso afeta nossa capacidade de foco, de retenção e até mesmo nossa percepção do tempo.
Muita gente sente que os dias passam rápido demais. Mas será que é o tempo que está correndo, ou a gente que não consegue mais estar inteiro em nada?
O impacto nas relações
Se por um lado a internet aproximou pessoas, por outro ela moldou novos modos de estar junto. As conversas ficaram mais curtas, as amizades precisam sobreviver a silêncios digitais, e os encontros presenciais viraram exceção. As redes sociais também criaram um padrão de comparação constante, onde a vida do outro sempre parece mais interessante.
Não à toa, tantos adultos hoje se sentem sozinhos, mesmo com centenas de contatos. A conexão digital não substitui o toque, o olhar, o tempo compartilhado fora da tela.
Reprogramar o que entendemos por sucesso
O online também moldou o que acreditamos ser uma vida bem-sucedida. A cultura da produtividade, o empreendedorismo como estilo de vida, o trabalho como identidade. Tudo isso se intensificou com a internet. Trabalhamos mais, mostramos mais, nos cobramos mais.
Mas também é justamente essa geração que começou a questionar tudo isso. O aumento dos pedidos de demissão, o desejo de desacelerar, o crescimento do nomadismo digital, os retiros de detox de telas. São tentativas de recuperar algum tipo de centro mesmo que temporário.
Ainda dá tempo de reprogramar?
Depois de três décadas online, a pergunta não é se dá pra voltar ao que era antes. A resposta, provavelmente, é não. Mas dá pra escolher como queremos seguir. Criar pausas conscientes. Cuidar da nossa presença, não só da nossa performance. Reaprender a se concentrar, a estar com alguém de verdade, a dizer não para o excesso de estímulos.
Se a internet moldou a forma como vivemos, também podemos moldar nossa relação com ela. Porque, no fim, ainda somos humanos e isso não muda com nenhuma atualização de algoritmo.

